O Japão pode ser considerado um país de primeiro mundo quando nos referimos à tecnologia, qualidade de vida, infraestrutura, saneamento básico etc. Mas é um país com cultura extremamente discriminatória e retrógrada, aonde os japoneses vem sempre em primeiro lugar, sendo resto o resto.
Lembro-me de um noticiário na televisão japonesa que anunciava o acidente de avião no exterior em que houveram centenas de mortos. Após o anúncio da tragédia, o apresentador ressaltava: “nenhum japonês estava entre os tripulantes do avião”, como se o que importava era o fato de existirem ou não japoneses vítimas naquela tragédia.
Citamos o caso de um casal de estrangeiros que tem um filho no Brasil, a criança recebe a nacionalidade brasileira. Recebe o mesmo tratamento em muitos países do mundo, mas no Japão não é assim. Os pais da criança deverá realizar o registro de nascimento no consulado, a transcrição poderá ser feito em um cartório tão logo retorne ao seu país de origem. Mas nunca receberá a cidadania japonesa.
Nos tempos de Japão tive a oportunidade de conhecer uma pessoa, que falava fluentemente a língua japonesa. Vim a saber que nasceu no Japão e seus pais estavam neste país há décadas. Mas para o meu espanto, ele me apresentou o “Gaijin Touroku Shoumeisho”, percebi que não era um japonês, e sim, um sul coreano. Apesar de ter nascido no Japão, ter estudado e assimilado a cultura japonesa, carregará para sempre o status de estrangeiro, salvo o caso de pedir a cidadania japonesa.
Em acidentes de trânsito, o fato de uma das parte ser estrangeira e não dominar o idioma japonês, deixa a em situação de grande vulnerabilidade. O policial japonês certamente tenderá a dar razão a parte japonesa, não se importando muito como é que aconteceu o acidente ou o incidente.
Todos os casos citados anteriormente deixam evidente a forma que os japoneses enxergam tudo que não é japonês, mas nesta pandemia da Covid-19 ficou muito mais claro.
O fechamento aos estrangeiros de 159 países do mundo no dia 03/04/2020, não levando em consideração se estes estrangeiros deixaram famílias no Japão, moradia, empregos ou estudos.
No dia 01/08/2020 foi aprovado a medida que permitiu a entrada de descendentes de japoneses até a sua segunda geração.
Em 01/10/2020 uma nova medida que reduziu as restrições de países de 159 para 152. Passou a permitir a entrada de descendentes de japoneses até a sua terceira geração, contanto que fizessem o teste de RT-PCR 72 horas antes da hora de embarque, um novo teste de saliva na chegada ao Japão, monitoramento GPS através do app Line, apresentação do Residence Track e isolamento de 14 dias.
O mais revoltante é que os japoneses estavam isentos de todos estes cuidados ao retornar do exterior. E foram justamente eles que aumentaram o índice de propagação da Covid-19 em Tóquio. Foram os japoneses que aumentaram a propagação do vírus no território japonês com a campanha Go To Travel. Foram os japoneses que trouxeram do Reino Unido a variante mais agressiva da Covid-19, H69V70.
E para surpresa da sociedade mundial, no dia 28/12/2020 foi fechada novamente as fronteiras do Japão para todos os países do mundo, exceto algumas da Ásia, por interesses comerciais. Vale ressaltar que descendentes de segunda geração japonesa e pessoas com visto de reentrada estão permitidos para entrada.
A implementação de todas as medidas sempre foi cercada por uma deficiência na comunicação, textos mal redigidos que corroboram para as mais diversas interpretações. As medidas sempre passam a valer antes da publicação nos sites dos órgãos do governo (Ministério da Justiça, Ministério das Relações Exteriores, Ministério da Saúde, Órgão de Imigração do Japão, Embaixadas e Consulados dos países que o Japão mantém relações diplomáticas). E pasmem, nesta última medida do dia 28/12/2020, nem o Consulado do Japão estava a par, conseguiu responder com detalhes a partir do dia 29/12/2020, um dia após o anúncio.
O mais curioso é que a proibição de entrada de estrangeiros no Japão foi publicado inicialmente no site do Aeroporto de Narita no dia 24/12/2020 às 0:00. Vide a matéria: https://mundo-nipo.com.br/japao-fecha-novamente-as-portas-para-o-estrangeiro/
Esta medida publicada no Aeroporto de Narita foi desmentido por profissionais que atuam na prestação de serviços de renovação de visto e pedido de Certidão de Elegibilidade no Japão. Ou seja, são profissionais que trabalham diretamente com o Órgão de Imigração do Japão, mas não foram informados corretamente quando questionaram à Imigração.
Na capa desta matéria há um maço de espinafre, conhecido como “hourensou” no Japão. Em organizações japonesas é quase que de lei ter um pôster escrito “hourensou”. Mas neste caso não se refere ao vegetal, e sim, nas iniciais das palavras HOUkoku (apresentar relatório), RENraku (contatar) e SOUdan (consultar, discutir).
Pelo que presenciamos em 2020, o governo japonês está mais para consumidor do vegetal, do que para a aplicação deste termo no dia a dia, colocam em xeque suas reputações como gestores.
Feliz 2021! Se é isso que podemos esperar do novo ano.
Portal Mundo-Nipo
Sucursal Japão Tóquio
Jonathan Miyata