Descubra a surpreendente história da violência política no Japão, um legado que desafia a imagem de nação pacífica. Essencial para expatriados e amantes do Japão.
O Japão de hoje é amplamente admirado como um bastião de paz e democracia, um contraste notável com a turbulência política vista em outras partes do mundo. No entanto, para aqueles que residem ou têm profundo interesse na cultura japonesa, como expatriados e descendentes, é crucial compreender que a história política do país nem sempre foi tão tranquila. Um olhar mais atento revela um passado onde a violência política no Japão era uma força intrínseca, moldando a nação de maneiras profundas e complexas.
O Legado de Uma Democracia Violenta
A imagem de um Japão sereno contrasta dramaticamente com grande parte de sua história moderna. Entre 1860 e 1960, o país foi rotineiramente descrito como uma “democracia violenta”. O livro “Rufiões, Yakuza, Nacionalistas: A Política Violenta do Japão Moderno”, de Eiko Maruko Siniawer, desvenda como a violência estava intrinsecamente ligada à política moderna japonesa.
Na década de 1860, os shishi – “homens corajosos” da classe samurai – empreenderam uma série de assassinatos contra oficiais do xogunato e dignitários estrangeiros. Eles se opunham veementemente à abertura do país à influência externa, resultando em dezenas de mortes e um clima de medo entre os estrangeiros.
Turbulência e Levantes Iniciais
As décadas seguintes não trouxeram calmaria. Nos anos 1870, levantes em massa liderados por ex-samurais descontentes eclodiram no sul do Japão. Já nos anos 1880, levantes de camponeses revoltados no centro do país foram instigados por bakuto, protótipos da yakuza que controlavam esquemas de jogo. Milhares de envolvidos foram julgados e condenados, com diversos líderes executados.
A Política Partidária e a Violência Contínua
Mesmo com a formação dos primeiros partidos políticos nas décadas de 1880 e 1890, a violência política persistiu. Partidos rivais empregavam milhares de capangas profissionais (soshi) para agredir e, por vezes, matar oponentes. Um exemplo chocante foi a eleição geral de 1892, onde 24 pessoas perderam a vida e 388 ficaram feridas em confrontos políticos.
Paradoxalmente, figuras influentes do movimento pela Liberdade e pelos Direitos do Povo, após a promulgação da Constituição Meiji em 1889, se tornaram “aventureiros continentais” (tairiku ronin). Eles atuaram na desestabilização de nações estrangeiras, promovendo os interesses japoneses através de meios violentos.
A Ascensão do Fascismo e o Pós-Guerra
A década de 1930 viu a ascensão do fascismo, onde a violência política no Japão atingiu novos patamares. Revoltas militares resultaram no assassinato brutal de importantes líderes políticos, tudo em nome do “renascimento nacional”. Essa escalada pode ser vista não como uma degeneração, mas como uma continuidade natural do cenário violento preexistente.
Mesmo após as reformas democráticas do pós-guerra, o recurso à repressão violenta não foi completamente abandonado. Em 1960, durante manifestações contra a renovação do tratado de segurança com os Estados Unidos, o primeiro-ministro Nobusuke Kishi convocou centenas de yakuza para dispersar as multidões.
A Paz Atual e o Legado Literário
É notável como o Japão conseguiu, nas últimas décadas do século XX, estabilizar-se e eliminar grande parte da violência política. Siniawer argumenta que isso se deu porque a violência passou a ser universalmente vista como “antidemocrática”, ao contrário do século anterior, onde parecia ligada às lutas democráticas. Além disso, o dinheiro substituiu a violência como principal meio de influência e coerção, trocando brigas por subornos.
Essa história turbulenta é um lembrete valioso para expatriados e entusiastas do Japão. A literatura japonesa, por sua vez, explora profundamente essa interação psicológica. Em “O Portão” (1910), de Natsume Soseki, a notícia do assassinato de Hirobumi Ito abala a tranquilidade suburbana, culminando em uma crise espiritual. Já em “A Caçada ao Carneiro Selvagem” (1982), de Haruki Murakami, a história se inicia no dia do Incidente Mishima, sugerindo que atos de violência política, mesmo em segundo plano, são absorvidos por nossa psique coletiva.
Compreender o passado da violência política no Japão oferece uma perspectiva mais rica e matizada da nação que hoje admiramos. É um país que, apesar de seu presente pacífico, carrega um legado complexo que continua a informar sua cultura e identidade.


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